Eu bem não quero escrever sobre temas que envolvam a política ou com ela tenham alguma relação. Mas, por mais que o evite ou por mais que disso me defenda, são tantas as coisas fabulosas (mesmo de fábula) que se vão sucedendo, tanta a falta de vergonha e de bom senso que permanentemente nos assalta, que me vejo forçado, absolutamente forçado, a ter que tecer algumas considerações sobre elas.
Deixando de lado outros problemas que mereceriam também a nossa atenção, vou hoje abordar um tema que me parece estar, neste momento, no top ten dos fait divers políticos.
A culpa não será toda dele, mas também de muitos de nós, não sei se de todos nós, que durante algum tempo lhe achámos alguma graça e nos fomos rindo das suas ousadias verbais, sem nunca termos em conta o nosso sentido crítico e ético que vamos exigindo em tudo e fomos esquecendo, a maioria das vezes, em relação às bacoradas de tão sinistra figura.
Penso que o desculpávamos porque ele nos parecia um desbocado, um mal criado por boas causas, uma vez que fazia transparecer sempre a ideia de que o que fazia e dizia, melhor, o que exigia, era tudo para bem da sua querida Madeira.
Com o passar dos anos e já lá vão trinta, penso que fomos sendo anestesiados criticamente, de modo que sempre que ele falava ou melhor dizendo, gritava, tínhamos quase a certeza de que nos iríamos rir e até nos ouvíamos dizer – ah, grande homem, assim é que se fala, sem papas na língua, mesmo que depois pensássemos que melhor teria sido pôr-lhe nela um pouco de pimenta.
Mas também com o passar dos anos, fomos vendo que, embora fizesse obra, o difícil seria não a ter feito, tais as somas que para isso recebia, mais o progressivo endividamento que ia construindo, que mais uma vez teria de ser pago pelas somas extraordinárias caçadas ao Contenente e saídas dos bolsos, dos tenebrosos cubanos, que teimavam em não perceber os verdadeiros custos da insularidade.
As eleições foram-se seguindo, as vitórias somando-se, a figura perpetuando-se com margens amplas de vitória. E cada vez mais cantava de poleiro..
Até que chegámos à sua terceira década de reinado, ao mesmo tempo que apareceu alguém capaz de dizer – basta!
A aplicação da lei das finanças regionais foi a gota de água que faltava. O rei da Madeira entrou em vrill[1] técnico e em desespero emocional, maior do que qualquer um que antes tivesse tido.
É verdade que, já em outras ocasiões em que a sua boa estrela tremelicou, usara de excessos verdadeiramente intoleráveis e com manifesta ausência de sentido de Estado. Ficou para a História a forma desrespeitosa com que falou do Snr. Silva, mas nada que se pareça com a linguagem actual.
Embora volte a atacar o Snr. Silva, o seu ódio de estimação está centrado no actual primeiro-ministro, que o rei diz desconhecer quem seja. Não entende, por mais que lhe expliquem, que os Açores também sofrem de insularidade e em mais ilhas do que aquelas em que reina. Para ele, a legislação deve ser feita à sua medida e contemplar todos os seus desejos, que, segundo ele, é o mesmo que dizer o desejo de todos os madeirenses. Nas tintas, para os problemas do País. Se este não tem dinheiro que o arranje. «Eu é que quero aqui o nosso dinheirinho, aquele que eu acho que nos faz falta. O resto que se lixe, os cubanos que aguentem, ninguém os mandou ser comunas!»
Tem sido um ver se te avias. Restaurou o fantasma da independência, tirando-o do jazigo onde se encontrava. Agitando suavemente essa bandeira, porque está farto de saber que melhor do que ser independente, se é isso alguma vez sucederia, é sentar-se à mesa do orçamento dos cubanos e encher o seu prato mais do o de qualquer outro conviva.
Agita essa bandeira numa tentativa de fazer «tremer o Contenente», só com a ideia de tal desastre. Mas o Snr. Jardim está farto de saber que falar na independência da Madeira é o mesmo que falar numa impossibilidade. De que viveria, então? do turismo? do off shore? dos recursos naturais? dos casinos? Talvez. Mas, seguramente, pior do que quando vivia do dinheiro dos cubanos que ele sempre gastou como entendeu, onde entendeu, favorecendo explicitamente os seus apoiantes e marimbando-se nos restantes, fazendo censura nos meios de comunicação que não comunguem com ele e injectando fortunas naquele que tudo merece, pois é porta voz das suas esclarecidas políticas e até o deixa escrever ali uma coluna quase em permanência.
Antigamente, sempre que precisava de mais dinheiro, endividava-se tranquilamente enquanto dava uns berros que se ouvissem no Contenente e logo alguém correria a satisfazer os seus desejos, pois aqueles votozinhos faziam muita falta ao seu partido. Agora, está mais complicado. Já percebeu que quando lhe dizem não, foi mesmo não que lhe disseram. Percebeu também que não vale a pena fazer ameaças, pois já lhe disseram basta.
Por isso, inventou mais uma manobra estratégica. Olhem que eu demito-me e demitiu-se mesmo.
Demito-me porque não tenho condições para governar com esta nova lei.
E, de uma forma coerente, como é seu hábito, o que fez o Snr. Jardim em seguida? Demitiu-se e abandonou o poleiro? Não meus senhores.
Coerentemente, como sempre, já que não tinha condições para governar com tal maldita lei, anunciou a sua recandidatura nas próximas eleições.
Onde irá buscar então as condições? Estará a pensar que, por ter novamente a maioria ou até a reforçar, vai obrigar os cubanos a ceder mais uma vez, a vergar a cerviz e servir seu insular amo, a seu inteiro gosto?
Poderei estar enganado, mas penso que desta vez, e pela primeira vez, o Snr. Jardim vai sentir que não adiantará mais dar berros e bater o pé.
Espero ainda que por uma vez, embora a primeira, tenha a decência e a modéstia de aceitar a democracia e começar a praticá-la no pequeno território onde governa.
Vai uma grande diferença entre este país ser considerado um jardim à beira-mar plantado e a tristeza de Portugal considerar como seu filho um Jardim a esbracejar e berrar, plantado no meio do mar.
[1] Termo usado em aeronáutica que corresponde a voo desordenado, em espiral. P.ex. «estava a fazer uma volta á pista para me habituar e quando ia a endireitar o avião, ele de repente entrou em vrill e nunca mais o apanhei».
Deixando de lado outros problemas que mereceriam também a nossa atenção, vou hoje abordar um tema que me parece estar, neste momento, no top ten dos fait divers políticos.
A culpa não será toda dele, mas também de muitos de nós, não sei se de todos nós, que durante algum tempo lhe achámos alguma graça e nos fomos rindo das suas ousadias verbais, sem nunca termos em conta o nosso sentido crítico e ético que vamos exigindo em tudo e fomos esquecendo, a maioria das vezes, em relação às bacoradas de tão sinistra figura.
Penso que o desculpávamos porque ele nos parecia um desbocado, um mal criado por boas causas, uma vez que fazia transparecer sempre a ideia de que o que fazia e dizia, melhor, o que exigia, era tudo para bem da sua querida Madeira.
Com o passar dos anos e já lá vão trinta, penso que fomos sendo anestesiados criticamente, de modo que sempre que ele falava ou melhor dizendo, gritava, tínhamos quase a certeza de que nos iríamos rir e até nos ouvíamos dizer – ah, grande homem, assim é que se fala, sem papas na língua, mesmo que depois pensássemos que melhor teria sido pôr-lhe nela um pouco de pimenta.
Mas também com o passar dos anos, fomos vendo que, embora fizesse obra, o difícil seria não a ter feito, tais as somas que para isso recebia, mais o progressivo endividamento que ia construindo, que mais uma vez teria de ser pago pelas somas extraordinárias caçadas ao Contenente e saídas dos bolsos, dos tenebrosos cubanos, que teimavam em não perceber os verdadeiros custos da insularidade.
As eleições foram-se seguindo, as vitórias somando-se, a figura perpetuando-se com margens amplas de vitória. E cada vez mais cantava de poleiro..
Até que chegámos à sua terceira década de reinado, ao mesmo tempo que apareceu alguém capaz de dizer – basta!
A aplicação da lei das finanças regionais foi a gota de água que faltava. O rei da Madeira entrou em vrill[1] técnico e em desespero emocional, maior do que qualquer um que antes tivesse tido.
É verdade que, já em outras ocasiões em que a sua boa estrela tremelicou, usara de excessos verdadeiramente intoleráveis e com manifesta ausência de sentido de Estado. Ficou para a História a forma desrespeitosa com que falou do Snr. Silva, mas nada que se pareça com a linguagem actual.
Embora volte a atacar o Snr. Silva, o seu ódio de estimação está centrado no actual primeiro-ministro, que o rei diz desconhecer quem seja. Não entende, por mais que lhe expliquem, que os Açores também sofrem de insularidade e em mais ilhas do que aquelas em que reina. Para ele, a legislação deve ser feita à sua medida e contemplar todos os seus desejos, que, segundo ele, é o mesmo que dizer o desejo de todos os madeirenses. Nas tintas, para os problemas do País. Se este não tem dinheiro que o arranje. «Eu é que quero aqui o nosso dinheirinho, aquele que eu acho que nos faz falta. O resto que se lixe, os cubanos que aguentem, ninguém os mandou ser comunas!»
Tem sido um ver se te avias. Restaurou o fantasma da independência, tirando-o do jazigo onde se encontrava. Agitando suavemente essa bandeira, porque está farto de saber que melhor do que ser independente, se é isso alguma vez sucederia, é sentar-se à mesa do orçamento dos cubanos e encher o seu prato mais do o de qualquer outro conviva.
Agita essa bandeira numa tentativa de fazer «tremer o Contenente», só com a ideia de tal desastre. Mas o Snr. Jardim está farto de saber que falar na independência da Madeira é o mesmo que falar numa impossibilidade. De que viveria, então? do turismo? do off shore? dos recursos naturais? dos casinos? Talvez. Mas, seguramente, pior do que quando vivia do dinheiro dos cubanos que ele sempre gastou como entendeu, onde entendeu, favorecendo explicitamente os seus apoiantes e marimbando-se nos restantes, fazendo censura nos meios de comunicação que não comunguem com ele e injectando fortunas naquele que tudo merece, pois é porta voz das suas esclarecidas políticas e até o deixa escrever ali uma coluna quase em permanência.
Antigamente, sempre que precisava de mais dinheiro, endividava-se tranquilamente enquanto dava uns berros que se ouvissem no Contenente e logo alguém correria a satisfazer os seus desejos, pois aqueles votozinhos faziam muita falta ao seu partido. Agora, está mais complicado. Já percebeu que quando lhe dizem não, foi mesmo não que lhe disseram. Percebeu também que não vale a pena fazer ameaças, pois já lhe disseram basta.
Por isso, inventou mais uma manobra estratégica. Olhem que eu demito-me e demitiu-se mesmo.
Demito-me porque não tenho condições para governar com esta nova lei.
E, de uma forma coerente, como é seu hábito, o que fez o Snr. Jardim em seguida? Demitiu-se e abandonou o poleiro? Não meus senhores.
Coerentemente, como sempre, já que não tinha condições para governar com tal maldita lei, anunciou a sua recandidatura nas próximas eleições.
Onde irá buscar então as condições? Estará a pensar que, por ter novamente a maioria ou até a reforçar, vai obrigar os cubanos a ceder mais uma vez, a vergar a cerviz e servir seu insular amo, a seu inteiro gosto?
Poderei estar enganado, mas penso que desta vez, e pela primeira vez, o Snr. Jardim vai sentir que não adiantará mais dar berros e bater o pé.
Espero ainda que por uma vez, embora a primeira, tenha a decência e a modéstia de aceitar a democracia e começar a praticá-la no pequeno território onde governa.
Vai uma grande diferença entre este país ser considerado um jardim à beira-mar plantado e a tristeza de Portugal considerar como seu filho um Jardim a esbracejar e berrar, plantado no meio do mar.
[1] Termo usado em aeronáutica que corresponde a voo desordenado, em espiral. P.ex. «estava a fazer uma volta á pista para me habituar e quando ia a endireitar o avião, ele de repente entrou em vrill e nunca mais o apanhei».