quarta-feira, março 30, 2011

ejaculação política precoce


Publicado no Jornal i de hoje, 30 de Março, o texto que aqui vos deixo merece a vossa atenção, reflexão e sorriso aberto. É um texto inteligente, lúcido e cheio de humor. Deleitem-se.

Ejaculação política precoce
por
José de Pina

Muitos analistas estão preocupados com as consequências da demissão de José Sócrates. Estávamos em crise e agora temos a crise em crise! Eu acho que pode ser bom. Como todos sabemos, em matemática, menos (Sócrates) com menos (Passos Coelho) dá mais. Mas a decisão de eleições antecipadas veio confirmar que Passos Coelho é uma lufada de ar fresco fora dos vícios do mainstream da política nacional: ainda antes de ser eleito, já está a quebrar promessas. Isto acontece porque o tempo de reacção política de Passos Coelho é demasiado curto para o tempo da realidade. Faltam dois meses para chegar ao poder, mas ele não se consegue aguentar; é o que se chama de ejaculação política precoce. A excitação para se chegar ao poder é tanta que ainda não se chegou lá e... já está! O IVA afinal pode aumentar! Mas temos de ser compreensivos com Passos; a ejaculação política precoce atinge, na sua maioria, quem nunca chegou ao poder, nem esteve em nenhum governo. Umas das terapêuticas mais eficazes, e que se aconselha nestes casos, é fixar o pensamento em coisas que nos distraiam do poder. Por exemplo: Passos Coelho, em vez de ouvir o Miguel Relvas, que oiça os Deolinda ou o Zé Cabra; que se ponha a pensar na sua casa de Massamá sempre que vai a S. Bento; e, quando estiver com Merkel, basta imaginar que está com Cavaco. Tudo coisas que o distraiam e façam esmorecer, prolongando o tempo de reacção, para que se desbronque só quando atingir o poder. Durão Barroso e Sócrates já se mostraram especialistas neste tantrismo. Argumentista/humorista

terça-feira, março 29, 2011

o farsolas e o pote

A opinião de um português em Bruxelas. Um sério aviso à navegação, feito por um português frontal, eurodeputado desalinhado que merece ser ouvido.

segunda-feira, março 28, 2011

é tudo relativo


Embora seja uma visão propositadamente exagerada, entende-se a razão de ser assim, pois doutra forma não obteria o efeito pretendido por quem escreveu o texto.
Exagerada e deformada, é certo. Mas certeira em grande parte dos casos. Se pensarmos um pouco, todos conhecemos alguém que se pode enquadrar neste amargo escrito.
Leiam e comentem.


Diálogo com um jovem à rasca
por
Rui Herbon

- Então, foste à manifestação da geração à rasca?

- Sim, claro.

- Quais foram os teus motivos?

- Acabei o curso e não arranjo emprego.

- E tens respondido a anúncios?

- Na realidade, não. Até porque de verão dá jeito: um gajo vai à praia, às esplanadas, as miúdas são giras e usam pouca roupa. Mas de inverno é uma chatice. Vê lá que ainda me sobra dinheiro da mesada que os meus pais me dão. Estou aborrecido.

- Bom, mas então porque não respondes a anúncios de emprego?

- Err...

- Certo. Mudando a agulha: felizmente não houve incidentes.

- É verdade, mas houve chatices.

- Então?

- Quando cheguei ao viaduto Duarte Pacheco já havia fila.

- Seguramente gente que ia para as Amoreiras.

- Nada disso. Jovens à rasca como eu. E gente menos jovem. Mas todos à rasca.

- Hum... E estacionaste onde? No parque Eduardo VII?

- Tás doido?! Um Audi TT cabrio dá muito nas vistas e aquela zona é manhosa. Não, tentei arranjar lugar no parque do Marquês. Mas estava cheio.

- Cheio de...?

- De carros de jovens à rasca como eu, claro. Que pergunta!

- E...?

- Estacionei no parque do El Corte Inglés. Pensei que se me despachasse cedo podia ir comprar umas coisinhas à loja gourmet.

- E apanhaste o metro.

- Nada disso. Estava em cima da hora e eu gosto de ser pontual. Apanhei um táxi. Não sem alguma dificuldade, porque havia mais jovens à rasca atrasados.

- Ok. E chegaste à manif.

- Sim, e nem vais acreditar.

- Diz.

- Entrevistaram-me em directo para a televisão.

- Muito bom. O que disseste?

- Que era licenciado e estava no desemprego. Que estava farto de pagar para as reformas dos outros.

- Mas, se nunca trabalhaste, também não descontaste para a segurança social.

- Não? Pois... não sei.

- Deixa-me adivinhar: és licenciado em Estudos Marcianos.

- F***-se! És bruxo, tu?

- Palpite. E então, gritaste muito?

- Nada. Estive o tempo todo ao telemóvel com um amigo que estava na manif do Porto. E enquanto isso ia enviado mensagens para o Facebook e o Twitter pelo iPhone e o Blackberry.

- Mas isso não são aparelhinhos caros para quem está à rasca?

- São as armas da luta. A idade da pedra já lá vai.

- Bem visto.

- Quiriquiri-quiriquiri-qui! Quiriquiri-quiriquiri-qui!

- Calma, rapaz. Portanto despachaste-te cedo e ainda foste à loja gourmet.

- Uma merda! A luta é alegria, de forma que continuámos a lutar Chiado acima, direitos ao Bairro Alto. Felizmente uma amiga, que é muito previdente, tinha reservado mesa.

- Agora os tascos do Bairro aceitam reservas?

- Chamas tasco ao Pap'Açorda?

- Errr... E comeram bem?

- Sim, sim. A luta é cansativa, requer energia. Mas o pior foi o vinho. Aquele cabernet sauvignon escorregava...

- Não me digas que foste conduzir nesse estado.

- Não. Ainda era cedo. Nunca ouviste dizer que a luta continua? E continuou em direcção ao Lux. Fomos de táxi. Quatro em cada um, porque é preciso poupar guito para o verão. Ah... a praia, as esplanadas, as miúdas giras e com pouca roupa...

- Já não vou ao Lux há algum tempo, mas com a crise deve estar meio morto, não?

- Qual quê! Estava à pinha. Muita malta à rasca.

- E daí foste para casa.

- Não. Apanhei um táxi para um hotel. Quatro estrelas, que a vida não está para luxos.

- Bom, és um jovem consciente. Como tinhas bebido e...

- Hã?! Tu passas-te! A verdade é que conheci uma camarada de luta e... bem... sabes como é.

- Resolveram fazer um plenário?

- Quê? Às vezes não te percebo.

- Costuma acontecer. E ficaram de ver-se?

- Ha! Ha! Ha! De ver-se, diz ele. Não estás a ver a cena. De manhã chegámos à conclusão que ela era bloquista e eu voto no Portas. Saiu porta fora. Acho que foi tomar o pequeno-almoço à Versailles.

- Tu tomaste o teu no hotel.

- Sim, mas mandei vir o room service, porque ainda estava meio ressacado.

- Depois pagaste e...

- A crédito, atenção. Com o cartão gold do Barclays.

- ... rumaste a casa.

- Sim, àquela hora a A5 não tinha trânsito. Já não havia malta à rasca a entupir o tráfego.

- Moras onde? Paço d'Arcos? Parede?

- Passas-te, ou quê…!? Que horror! Não, não. Moro na Quinta da Marinha, numa casita modesta que os meus pais se vêem à rasca para pagar. Para a próxima levo-os comigo.

segunda-feira, março 21, 2011

o que faz um tango


São precisos dois para dançar o tango. Neste momento crucial que atravessamos, parece não haver parceiros, mesmo para o dançarem virtualmente, sem chama, sem desejo, como muitos o têm dançado - a fingir que o fazem.
Lembrei-me do que Mário Sabino escreveu sobre o tango e aqui o deixo para quem o queira ler.


O que faz de um tango um tango não são as letras lamechas. O que faz de um tango um tango não é o Gardel, morto, que canta cada vez melhor. O que faz de um tango um tango não são os passos ensaiados na tradição. O que faz de um tango um tango não é a orquestra, com o ar cansado de quem já viu tudo. O que faz de um tango um tango não são as pernas altas da dançarina, vestidas de meias pretas com ligas. Nem o seu cabelo preso, ora com uma flor, ora com uma fita.

O que faz de um tango um tango não é o chapéu antigo do dançarino. Não são os seus sapatos lustrosos. Não é o seu fato às riscas. Não é o lenço vermelho, dobrado no bolso da lapela. O que faz de um tango um tango não é Buenos Aires. Não é qualquer geografia.

O tango não está no mundo das latitudes, das longitudes, das cartografias, dos guias turísticos.

O que faz de um tango um tango é a atração e a repulsa. É a tentação e o medo. É o afecto e a raiva. O que faz de um tango um tango é ela, seguindo na mesma direção dele, e ele, seguindo na mesma direção dela - até que um tenta fugir e o outro tenta impedir, numa alternância de fugas que se querem e que não se querem. O que faz de um tango um tango é a dor de um e do outro transformada em coreografia simétrica. O que faz de um tango um tango é o encontro que se desencontra e se reencontra. O que faz de um tango um tango são os volteios do amor dos poemas clássicos, das canções dos trovadores. Os volteios do amor que bebe no prazer e na fúria. Os volteios do amor que amorna para logo depois torna a incandescer. O que faz de um tango um tango é o amor que, na iminência de um final que se prenuncia infeliz, acha o final feliz. Porque nunca, num tango que é tango, os dançarinos terminam separados, descolados, deslocados.

O que faz de um tango um tango sou eu dentro de ti na carne e tu dentro de mim na alma, depois do último acorde, depois do último aplauso, depois da última lágrima, depois do último gozo.
O que faz de um tango um tango é a música que se quer silêncio.
O silêncio dos amantes.

quinta-feira, março 17, 2011

desgarrada com garra

Enquanto aguardamos que o Fado seja considerado património imaterial da UNESCO, vai sabendo bem ouvir as suas novas vozes, apresentadas pelas antigas.
João Braga e Maria da Fé, juntam-se a Camané, Miguel Capucho, Mariza, Mafalda Arnauth, Maria Ana Bobone, Rodrigo Costa Félix, Gonçalo Salgueiro, Joana Amendoeira, Nuno Guerreiro e Gonçalo Salgueiro numa desgarrada intitulada "Norte/Sul", uma paródia que nos diverte e que envolve também o Centro.

quarta-feira, março 16, 2011

um olhar sobre esta geração


Recebi hoje um texto não assinado onde, em meu entender, o autor faz uma análise bastante real e inteligente do que se está a passar com esta geração e onde analisa as razões ou as causas de aqui se ter chegado. Parece-me uma análise serena e lúcida, que merece ser lida. Muitos dos possíveis leitores poderão sentir-se aqui retratados, enquanto outros haverá que não o aceitem. Aqui fica, para uns e outros.

GERAÇÃO À RASCA???


Um dia, isto tinha de acontecer.

Existe uma geração à rasca?
Existe mais do que uma! Certamente!
Está à rasca a geração dos pais que educaram os seus meninos numa abastança caprichosa, protegendo-os de dificuldades e escondendo-lhes as agruras da vida.
Está à rasca a geração dos filhos que nunca foram ensinados a lidar com frustrações.
A ironia de tudo isto é que os jovens que agora se dizem (e também estão) à rasca são os que mais tiveram tudo.
Nunca nenhuma geração foi, como esta, tão privilegiada na sua infância e na sua adolescência. E nunca a sociedade exigiu tão pouco aos seus jovens como lhes tem sido exigido nos últimos anos.
Deslumbradas com a melhoria significativa das condições de vida, a minha geração e as seguintes (actualmente entre os 30 e os 50 anos) vingaram-se das dificuldades em que foram criadas, no antes ou no pós 1974, e quiseram dar aos seus filhos o melhor.
Ansiosos por sublimar as suas próprias frustrações, os pais investiram nos seus descendentes: proporcionaram-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre (já lá vamos...), mas também lhes deram uma vida desafogada, mimos e mordomias, entradas nos locais de diversão, cartas de condução e 1º automóvel, depósitos de combustível cheios, dinheiro no bolso para que nada lhes faltasse. Mesmo quando as expectativas de primeiro emprego saíram goradas, a família continuou presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada.
Durante anos, acreditaram estes pais e estas mães estar a fazer o melhor; o dinheiro ia chegando para comprar (quase) tudo, quantas vezes em substituição de princípios e de uma educação para a qual não havia tempo, já que ele era todo para o trabalho, garante do ordenado com que se compra (quase) tudo. E éramos (quase) todos felizes.
Depois, veio a crise, o aumento do custo de vida, o desemprego,... A vaquinha emagreceu, feneceu, secou.
Foi então que os pais ficaram à rasca.
Os pais à rasca não vão a um concerto, mas os seus rebentos enchem Pavilhões Atlânticos e festivais de música e bares e discotecas onde não se entra à borla nem se consome fiado.
Os pais à rasca deixaram de ir ao restaurante, para poderem continuar a pagar restaurante aos filhos, num país onde uma festa de aniversário de adolescente que se preza é no restaurante e vedada a pais.
São pais que contam os cêntimos para pagar à rasca as contas da água e da luz e do resto, e que abdicam dos seus pequenos prazeres para que os filhos não prescindam da internet de banda larga a alta velocidade, nem dos qualquercoisaphones ou pads, sempre de última geração.
São estes pais mesmo à rasca, que já não aguentam, que começam a ter de dizer "não". É um "não" que nunca ensinaram os filhos a ouvir, e que por isso eles não suportam, nem compreendem, porque eles têm direitos, porque eles têm necessidades, porque eles têm expectativas, porque lhes disseram que eles são muito bons e eles querem, e querem, querem o que já ninguém lhes pode dar!
A sociedade colhe assim hoje os frutos do que semeou durante pelo menos duas décadas.
Eis agora uma geração de pais impotentes e frustrados.
Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que colecciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional.
Eis uma geração que vai a toda a parte, mas que não sabe estar em sítio nenhum. Uma geração que tem acesso a informação sem que isso signifique que é informada; uma geração dotada de trôpegas competências de leitura e interpretação da realidade em que se insere.
Eis uma geração habituada a comunicar por abreviaturas e frustrada por não poder abreviar do mesmo modo o caminho para o sucesso. Uma geração que deseja saltar as etapas da ascensão social à mesma velocidade que queimou etapas de crescimento. Uma geração que distingue mal a diferença entre emprego e trabalho, ambicionando mais aquele do que este, num tempo em que nem um nem outro abundam.
Eis uma geração que, de repente, se apercebeu que não manda no mundo como mandou nos pais e que agora quer ditar regras à sociedade como as foi ditando à escola, alarvemente e sem maneiras.
Eis uma geração tão habituada ao muito e ao supérfluo que o pouco não lhe chega e o acessório se lhe tornou indispensável.
Eis uma geração consumista, insaciável e completamente desorientada.
Eis uma geração preparadinha para ser arrastada, para servir de montada a quem é exímio na arte de cavalgar demagogicamente sobre o desespero alheio.
Há talento e cultura e capacidade e competência e solidariedade e inteligência nesta geração?
Claro que há. Conheço uns bons e valentes punhados de exemplos!
Os jovens que detêm estas capacidades/características não encaixam no retrato colectivo, pouco se identificam com os seus contemporâneos, e nem são esses que se queixam assim (embora estejam à rasca, como todos nós).
Chego a ter a impressão de que, se alguns jovens mais inflamados pudessem, atirariam ao tapete os seus contemporâneos que trabalham bem, os que são empreendedores, os que conseguem bons resultados académicos, porque, que inveja! que chatice!, são betinhos, cromos que só estorvam os outros (como se viu no último Prós e Contras) e, oh, injustiça!, já estão a ser capazes de abarbatar bons ordenados e a subir na vida.
E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito e que pelos vistos - e a acreditar no que ultimamente ouvimos de algumas almas - ocupamos injusta, imerecida e indevidamente?!!!
Novos e velhos, todos estão à rasca.
Apesar do tom desta minha prosa, o que eu tenho mesmo é pena destes jovens.
Tudo o que atrás escrevi serve apenas para demonstrar a minha firme convicção de que a culpa não é deles.
A culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar nem educar, nem fazer melhor, mas é uma culpa que morre solteira, porque é de todos, e a sociedade não consegue, não quer, não pode assumi-la.
Curiosamente, não é desta culpa maior que os jovens agora nos acusam. Haverá mais triste prova do nosso falhanço?
Pode ser que tudo isto não passe de alarmismo, de um exagero meu, de uma generalização injusta.
Pode ser que nada/ninguém seja assim.

terça-feira, março 15, 2011

quem tem unhas ...?

Normalmente não gosto de ver «habilidades» de crianças. Penso sempre que por trás do aparente virtuosismo se encontra um chicote e muitas vezes exploração. Por outro lado, fico sempre com a sensação de que nessas habilidades não há alma, mas regras obrigatórias, treino desmedido, não desejado, nem consentido e que o que se vê é apenas técnica; nada de humanos, mas de robots.
Apesar disso, resolvi colocar aqui este vídeo de um quinteto de violas que parecem justificar o que escrevi, sobretudo sabendo que são crianças da Coreia do Norte. Tocam as suas violas ou «guitars» com exemplar mestria e precisão de sons, gestos, movimentos de cabeça, tipo preparação militar.
Mas apesar disso (novamente), tenho de deixar a dúvida de que elas possam sentir a música, pela música e sentirem-se felizes com o que fazem, porque querem e não porque lho mandam fazer. Quem dera que seja assim.


quarta-feira, março 09, 2011

recordando maya plisetskaya

Nunca é demais recordar a incomparável Maya Plisetskaya, dançando em 1969 a Morte do Cisne, de Camille Saint-Saëns, com coreografia de Michel Fokine feita para Anna Pavlova.


segunda-feira, março 07, 2011

vou-me embora p'ra pasárgada, lá sou amigo do rei

Encontrei hoje um dos poemas da minha juventude, na voz e interpretação de Jessier Quirino, brasileiro da Paraíba. Dentro da poesia de Manuel Bandeira, o poema «Vou-me embora p'ra Pasárgada» era o meu favorito.
Durante a minha estadia em Cabinda, durante a guerra colonial, tive ocasião de manter durante meses um programa radiofónico que intitulei «Poesia, Música e Teatro - Trilogia necessária», onde um dos poetas apresentados foi Manuel Bandeira. Se nessa altura tivesse as possibilidades técnicas de hoje, seguramente teria poupado aos ouvintes a minha leitura de Bandeira e ter-lhes-ia dado a interpretação Jessier Quirino.
Não o pude fazer, então. mas posso deixá-la aqui para vocês,
hoje.

uma animação que o é, sobre outra que não o é

Estamos no Carnaval. Foi celebração que nunca me interessou e, muito menos, me entusiasmou. Mas hoje mandaram-me esta animação feita para anunciar o Carnaval do Rio e, disto sim, eu gostei. Aqui fica para os que gostam e os que não apreciam o Carnaval ou que só apreciam dele a benesse do feriado ou tolerância de ponto.

sexta-feira, março 04, 2011

no arms, no legs

Quando aquilo que aqui se escreve e aquilo que aqui se mostra começa a atingir números muito elevados, sucede termos que fazer a pergunta - será que já falei sobre isto? será que já mostrei isto?
Hoje essa dúvida veio mais uma vez ter comigo. Procurei confirmar, mas não consegui. Na dúvida, quando ela é deste teor, a minha decisão é deixar de a ter e considerar apenas o valor próprio do que se vai mostrar. Tenho a certeza de que quem já viu, verá outra vez, quem não viu, verá mais do que uma vez.
Ninguém pode ficar indiferente a esta fibra, a este coração enorme, a estes princípios. Basta de palavras. Apresento-vos Nick Vujicic, um grande homem.

quarta-feira, março 02, 2011

tempo de chacais e de hienas


Dá pena assistir-se com grande frequência a actos de manifesta estupidez, inveja e maldade. Assistimos a essas manifestações nos campos mais variados - naqueles onde não nos admiramos tanto, por já o esperarmos e noutros em que não estávamos à espera que tal pudesse suceder.
Vem isto a propósito das recentes alterações editoriais no Expresso e na sua revista Atual. Na maioria das mudanças ou danças de colaboradores, creio que nenhum dos leitores mais fiéis deixará de se interrogar com a razão ou sem razão de tais decisões. Quem decide dirá que são apenas mudanças cosméticas, um refresh, incapazes de assumirem as verdadeiras razões (no plural, porque admito que sejam várias). Pode ser que me engane, mas não adivinho grandes coisas a virem. Pode ser que me engane e se assim for, aqui deixarei em devida altura o meu mea culpa.
Para quem não tenha lido deixo aqui a transcrição do último texto de um cronista exemplar, José Manuel dos Santos, intitulado Despedida e que é um retrato perfeito do seu estilo, da sua cultura, da sua honestidade e da sua frontalidade. Vamos ter, todos, muita pena da sua coluna Impressão Digital, onde como ele próprio escreve «falei muito do que se fala pouco e falei pouco do que se fala muito».
Não deixem de o ler.


Despedida
No próximo sábado - e por uma decisão que não foi minha - já não aparecerá aqui esta crónica semanal. Os que a procurarem encontrarão, em vez dela, uma ausência que lhes dirá a gratidão por estes anos em que olhámos as ilusões e as desilusões de um tempo que não começou ontem nem terminará amanhã. Tudo vem de mais longe e vai para mais longe do que suspeitam aqueles para quem a origem do mundo está na data do seu nascimento. A todos os que se tornaram meus leitores - e alguns, por isso, leitores do Expresso - entrego o meu reconhecimento com uma mão que acena, sabendo que uma despedida pode não ser um fim. As palavras que acabam são como os mortos que não morrem nos fantasmas em que vivem para inquietar os vivos.
Nestas crónicas, falei muito do que se fala pouco e falei pouco do que se fala muito. Falei do que é meu como se fosse dos outros e do que é dos outros como se fosse meu. Quis lembrar que, no mundo, não há só vencedores, pragmáticos, comunicadores, gestores, milionários, famosos, neoliberais, conformistas, contentinhos, poder, ruído, multidões, mais-valias, televisões, best sellers, condomínios fechados. Que há também vencidos, tímidos, desempregados, imigrantes, pobres, vagabundos, mendigos, doidos, poetas, idealistas, rebeldes, doentes, velhos, melancólicos, anarquistas, liberdade, silêncio, solidão, sabedoria, tiragens pequenas, bairros populares. Fiz da indignação uma serenidade. Recusei a crueldade que usa a máscara da eficácia. Tentei, em vez da rapidez de uma opinião, a lentidão de um pensamento. Procurei falar de uma grandeza que dá ao homem o direito a usar um nome que não o envergonhe. E sei bem de que grandeza falo, pois encontro-a nas palavras de Albert Camus: "No segredo do meu coração não me sinto em estado de humildade senão perante as vidas mais pobres ou as grandes aventuras do espírito humano. Entre as duas, encontra-se hoje uma sociedade que dá vontade de rir."
Este é o mundo que fez de "A Sociedade do Espectáculo" (Guy Debord) o seu livro de estilo: "Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção anuncia-se como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era diretamente vivido afastou-se numa representação". Nele, o cronista é um Fernão Lopes da sua perplexidade. Hoje, o jornalismo vive sobre o abismo, e ter disso a incómoda consciência é prevenir a queda nele. Mas há os que desviam o olhar do chão que lhes foge debaixo dos pés, avançando numa fuga para a frente de que ficará apenas o rasto de um desastre que lhes parece um êxito .
Ganharíamos em conhecer melhor a geologia do jornalismo contemporâneo, esse poder-espetáculo que afirma tantas vezes a liberdade para melhor a negar. Lucraríamos em não ignorar o que está debaixo do terreno movediço onde ele firma a sua autoridade e sacraliza a sua missão. Seria útil analisarmos as condições em que o jornalismo produz o seu discurso de verdade, com que se justifica e enaltece, fundando uma teologia da qual é o deus menor. Seria bom avaliarmos a validade desse discurso e os efeitos da sua automitificação, da sua boa consciência, do seu conformismo irrequieto. Seria fundamental conhecermos os ímanes, visíveis e ocultos, que regem as atrações e repulsões no seu campo. Ficaríamos surpreendidos se alguém fizesse para a instituição jornalística o que Foucault fez para outras instituições e dispositivos de normalização social: a justiça penal, a clínica, o saber, a psiquiatria, a sexualidade. Talvez as gerações futuras olhem um dia com horror a mistura explosiva de cinismo e violência, avidez e leviandade, sobranceria e perversidade com que nos olhámos no mundo.
Neste tempo megalómano e exibicionista, em que todos procuram uma insaciada autoestima e já não parece haver lugar para a subtileza, a compaixão e a cortesia, convém mantermos o sentido da memória e da medida. Sempre soube que, em mim, para cada abundância há uma escassez. Aprendi cedo a admirar o que é grande e os que são grandes (mesmo que tenham vivido no século V antes de Cristo) para não reconhecer logo o que é pequeno. E o que vejo por aí é uma pequenez alucinada e convencida da sua grandeza inexistente. Por isso, não há melhores palavras para dizer este tempo e este modo do que as que Lampedusa deu ao príncipe de Salina: "Nós fomos os Leopardos, os Leões; os que vêm são os chacais, as hienas." É com o sangue dos outros que eles alimentam a vaidade que lhes impede de ver a vulgaridade e o vazio que os faz ser o que são.
Agora, olho o céu e a sua luz desfeita. Há um raio que entra e cai sobre a capa de um velho livro onde se fala do "amor que move o sol e as outras estrelas". E isso torna a minha vida feliz. (Dedico esta última crónica ao Henrique Monteiro e ao Fernando Diogo, que me convidaram a escrever no Expresso).

terça-feira, março 01, 2011

como solnado nos fazia rir em 1967

Recordar Raul Solnado é sempre um mergulho no humor e uma inevitável recordação da sua habitual despedida - façam o favor de ser felizes.
No vídeo que vos deixo, Solnado estava no Brasil e contracena com o artista brasileiro Zeloni, em que este o quer conduzir para a estafada paródia sobre portugueses e Solnado vai fazendo que alinha e deixa o outro K.O. no último round. É tão profissional que nada parece preparado...