O facto de um dos temas do próximo congresso da UMEM (União Mundial dos Escritores Médicos), a realizar em Dresden, ser «o milagre», levou-me a pensar sobre ele e verificar qual o ponto da situação actual ou, como é comum dizer-se hoje, qual o «estado da arte» daquilo que o dicionário define como sendo o acto ou acontecimento fora do comum, inexplicável pelas leis naturais, acontecimento formidável, estupendo, evento que provoca surpresa e admiração, tipo de drama medieval baseado na vida dos santos, qualquer indicação da participação divina na vida humana, indício dessa participação que se revela por uma alteração súbita e fora do comum das leis da natureza, objecto de madeira ou cera com reprodução de uma parte do corpo e oferecido aos santos em cumprimento de uma promessa, prodígio, maravilha, coisa prodigiosa, extraordinária …
Embora o trabalho que vou apresentar seja sobre o outro tema – a solidariedade – entendi que o ter pensado sobre o milagre me obriga, de certa maneira, a dar-vos conta dessa reflexão, pelas diferenças que encontrei ou me pareceram existir hoje e pela visão desiludida e sarcástica com que fiquei.
A primeira reflexão levou-me a pensar que o milagre «clássico» deixou de existir (salvo para aqueles que neles acreditam por devoção ou para a Congregação dos Santos que sobre eles se debruça e os analisa) e que passou a haver uma extraordinária inflação de milagrezinhos, no sentido do que provoca surpresa e admiração.
Actualmente, pode dizer-se que todos os dias há milagres, porque todos os dias alguém tem necessidade deles.
O milagre deixou de ser um acontecimento raro e fora do comum, só despertado por situações extremas que o justificassem, para passar a ser quase banal, tão banal que nem os telejornais o noticiam (mesmo sendo a especialidade desses jornais a banalidade).
Mas os milagres de hoje são muito diferentes, já não são o que eram (como aliás se passa com a maioria das coisas). Primeiro por já não serem de realização e decisão divina e terem passado a ser instrumentos do mais comum dos mortais.
Hoje, não é milagre dizer - «levanta-te e caminha» e assistir-se então à concretização dessa ordem divina, com o paralítico levantando-se e caminhando, manifestação contrária a qualquer teoria ou prática científica, mas manifesto sinal do poder divino.
Hoje o que é milagre, é muitos de nós chegarem ao fim do dia e dizerem – continuo vivo, apesar de tudo. Não fiz jogging, não fui ao ginásio, não tenho (nem posso ter) personal training, fitness é apenas uma palavra, não me resguardo de frio nem calor, só respiro poluição, como à pressa esse ignóbil manjar apelidado de fast food, sou pontapeado e escorraçado por uma série de supostos irmãos e amigos, em sentido figurado ou mesmo real.
Mas o que é prodigioso, extraordinário, ainda mais milagre, é chegar ao fim do dia e dizer – continuo a ter capacidade de amar, de me surpreender, de sonhar, de admirar, apesar de todas as contrariedades, da globalização, da uniformidade de formas, cores, gostos e funções, de tudo de que nos servimos e até daqueles outros humanos com que nos cruzamos ou convivemos de perto.
Hoje ninguém espera ver Deus a falar para o cego e a dizer-lhe simplesmente - «abre teus olhos e vê». E o cego abrir os olhos, fazer uma cara de espanto, olhar á volta como se sempre o tivesse feito, em todos os sentidos, devagar, logo depressa, logo devagar outra vez e gritar – obrigado, meu Deus, obrigado. E logo perguntando – Então o mundo é isto que eu vejo? E porque te não vejo a ti, meu Deus? Ou se te vejo, o que te distingue dos outros que estou vendo?
Hoje o que se espera é que um cientista, um investigador da grossa comunidade científica do mundo on line, mostre a sua cara na televisão e respondendo à pergunta do apresentador, diga simplesmente – hoje acabei com a cegueira.
Com o processo que eu e a minha equipa inventámos, todos, daqui em diante, verão todas as coisas e nas melhores condições. Que se cuidem pois os fabricantes de bengalas para cegos, os editores de livros em Braille, os treinadores de cães-guia. Reciclem-se, se não querem ir para o desemprego.
Aí o locutor dirá – confirma que, a partir de agora, todos os invisuais ou quase invisuais, passarão a ter uma visão completa?
Sim, confirmo. Isso, só não sucederá se os governos, míopes e mesquinhos como costumam ser, não abrirem os cordões às bolsas e não suportarem os altos custos do processo quase milagroso que inventei.
Está a tentar dizer-me que a situação encontrada para a resolução da cegueira é muito cara?
Estou a dizer-lhe que é cara para os necessitados, mas é perfeitamente suportável pelos ricos e por qualquer orçamento de um Estado que tenha um PIB decente. É isso que eu e os meus sócios esperamos.
Por certo, espera ganhar o Prémio Nobel deste ano?
Talvez seja justo que me seja concedido, mas se quer que lhe diga o que verdadeiramente espero e desejo, é que no próximo ano o meu nome já conste na lista da Forbes ou da Fortune…
Embora o trabalho que vou apresentar seja sobre o outro tema – a solidariedade – entendi que o ter pensado sobre o milagre me obriga, de certa maneira, a dar-vos conta dessa reflexão, pelas diferenças que encontrei ou me pareceram existir hoje e pela visão desiludida e sarcástica com que fiquei.
A primeira reflexão levou-me a pensar que o milagre «clássico» deixou de existir (salvo para aqueles que neles acreditam por devoção ou para a Congregação dos Santos que sobre eles se debruça e os analisa) e que passou a haver uma extraordinária inflação de milagrezinhos, no sentido do que provoca surpresa e admiração.
Actualmente, pode dizer-se que todos os dias há milagres, porque todos os dias alguém tem necessidade deles.
O milagre deixou de ser um acontecimento raro e fora do comum, só despertado por situações extremas que o justificassem, para passar a ser quase banal, tão banal que nem os telejornais o noticiam (mesmo sendo a especialidade desses jornais a banalidade).
Mas os milagres de hoje são muito diferentes, já não são o que eram (como aliás se passa com a maioria das coisas). Primeiro por já não serem de realização e decisão divina e terem passado a ser instrumentos do mais comum dos mortais.
Hoje, não é milagre dizer - «levanta-te e caminha» e assistir-se então à concretização dessa ordem divina, com o paralítico levantando-se e caminhando, manifestação contrária a qualquer teoria ou prática científica, mas manifesto sinal do poder divino.
Hoje o que é milagre, é muitos de nós chegarem ao fim do dia e dizerem – continuo vivo, apesar de tudo. Não fiz jogging, não fui ao ginásio, não tenho (nem posso ter) personal training, fitness é apenas uma palavra, não me resguardo de frio nem calor, só respiro poluição, como à pressa esse ignóbil manjar apelidado de fast food, sou pontapeado e escorraçado por uma série de supostos irmãos e amigos, em sentido figurado ou mesmo real.
Mas o que é prodigioso, extraordinário, ainda mais milagre, é chegar ao fim do dia e dizer – continuo a ter capacidade de amar, de me surpreender, de sonhar, de admirar, apesar de todas as contrariedades, da globalização, da uniformidade de formas, cores, gostos e funções, de tudo de que nos servimos e até daqueles outros humanos com que nos cruzamos ou convivemos de perto.
Hoje ninguém espera ver Deus a falar para o cego e a dizer-lhe simplesmente - «abre teus olhos e vê». E o cego abrir os olhos, fazer uma cara de espanto, olhar á volta como se sempre o tivesse feito, em todos os sentidos, devagar, logo depressa, logo devagar outra vez e gritar – obrigado, meu Deus, obrigado. E logo perguntando – Então o mundo é isto que eu vejo? E porque te não vejo a ti, meu Deus? Ou se te vejo, o que te distingue dos outros que estou vendo?
Hoje o que se espera é que um cientista, um investigador da grossa comunidade científica do mundo on line, mostre a sua cara na televisão e respondendo à pergunta do apresentador, diga simplesmente – hoje acabei com a cegueira.
Com o processo que eu e a minha equipa inventámos, todos, daqui em diante, verão todas as coisas e nas melhores condições. Que se cuidem pois os fabricantes de bengalas para cegos, os editores de livros em Braille, os treinadores de cães-guia. Reciclem-se, se não querem ir para o desemprego.
Aí o locutor dirá – confirma que, a partir de agora, todos os invisuais ou quase invisuais, passarão a ter uma visão completa?
Sim, confirmo. Isso, só não sucederá se os governos, míopes e mesquinhos como costumam ser, não abrirem os cordões às bolsas e não suportarem os altos custos do processo quase milagroso que inventei.
Está a tentar dizer-me que a situação encontrada para a resolução da cegueira é muito cara?
Estou a dizer-lhe que é cara para os necessitados, mas é perfeitamente suportável pelos ricos e por qualquer orçamento de um Estado que tenha um PIB decente. É isso que eu e os meus sócios esperamos.
Por certo, espera ganhar o Prémio Nobel deste ano?
Talvez seja justo que me seja concedido, mas se quer que lhe diga o que verdadeiramente espero e desejo, é que no próximo ano o meu nome já conste na lista da Forbes ou da Fortune…
1 comentário:
Olá,Doutor,que tudo esteja bem consigo,que é o mesmo que desejar que tudo esteja bem com os seus mais seus.
Tem esta intromissão no seu blogue,mais um abuso,que certamente me desculpará,o própósito de fazer dois ou três humildes comentários ao seu texto,que,devo dizer,se enquadra no tema(solidariedade)onde vai apresentar uma comunicação.
E vou começar pelo fim do texto,um remate feliz.Mas é assim doutor,não se passa disto,desde,talvez, Adão,que DEUS lá tenha em descanso. Muito poucos não quererão figurar nessas apetitosas listas. Porque a realidade é esta doutor-os ricos querem ser cada vez mais ricos,e os pobres,oh,os pobres,só se não puderem. Anda quase toda a gente ao mesmo. Não tenhamos ilusões,com ou sem sarcasmo.
E só mais esta,doutor,a propósito de milagres. Já me não lembra o nome do pensador. Dizia ele que ninguém se admirava da chuva vir de cima para baixo. Era natural,estava conforme as leis da natureza(essas muitas leis,todas naturais,nenhuma milagrosa).Mas se um dia,há sempre um dia,a vissem cair de baixo para cima? Milagre,milagre. E a outra,a natural?É uma coisinha de trazer por casa.
E vou terminar que já está a ser demasiado. O milagre de um nascimento,uma vida vinda de duas células,o crescer,o desenvolver,o declinar,o regressar ao seio da natureza,o "big bang",os "big bang",porque houve um antes,e mais outro antes... O milagre de uma flor,de um fruto,da melancia,que estamos no tempo dela,do AMOR,de um beijo de criança,da incência,da gratidão...
As mimhas muitas desculpas,e muita saúde,e uma boa presença no Congresso da UNEM.
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