quinta-feira, março 09, 2006

E, se eu vos contasse? – 6.º programa – A Medicina dos Romanos



Mapa da ocupação romana
Apesar dos contactos com os gregos, tudo indica que nos primeiros séculos a medicina dos romanos fosse quase exclusivamente mágica, atribuindo-se apenas aos deuses a capacidade de curar, havendo entre eles os generalistas que acudiam a todos os males e aqueles que eram especializados apenas em certas doenças.
Parece que no século IV AC., havia já médicos em Roma, pois encontraram-se notícias de um médico ter sido acusado de ter morto uma doente por descuido e por isso ter sido condenado. Parece que os primeiros médicos de que Roma dispôs, eram gregos e até ao final da república todos terão sido estrangeiros. Segundo os historiadores, isso seria devido ao facto de os romanos não considerarem a profissão de médico como sendo digna de ser exercida por cidadãos romanos, pelo que a tradição proibia que os patrícios romanos exercessem a profissão de médicos, devendo apenas ser exercida por escravos, libertos e estrangeiros. Mas tudo isto se alterou quando os médicos gregos começaram a tornar-se homens ricos e poderosos e com acesso às grandes casas senhoriais. A opinião dos romanos em relação a esta profissão modificou-se, e de tal modo, que o poder acabou por reconhecer a cidadania romana aos estrangeiros e a todos aqueles que fossem médicos.
Apareceu a corrente médica dos epicuristas que defendiam que o mundo era composto de uma série infinita de átomos pequeníssimos que se uniam por acaso, sem intervenção da razão. Entre os átomos que compõem a matéria, haveria poros, canalículos dotados de sensibilidade, nos quais se movia um número infinito de partículas pequeníssimas.
Com o advento do Império, apareceu a corrente dos metodistas, de que Sorano de Éfeso foi um dos mais conhecidos representantes e tido como o fundador da obstetrícia e da ginecologia. No livro que escreveu «Sobre as doenças da mulher», tem conceitos muito actuais, como já aconselhar a dupla laqueação do cordão umbilical na altura do parto, a lavar os olhos do recém-nascido e dar indicações sobre o vestuário da criança. Como método anticoncepcional aconselhava tapar o colo do útero com algodão, unguentos e substâncias gordas.
O curioso, no entanto, é que apesar de inicialmente não estimularem esta profissão, os legisladores sempre se preocuparam com a higiene, quer a nível corporal, quer dos esgotos, havendo inúmeros exemplos que ainda hoje perduram e que fazem ter vergonha de alguns sistemas actuais de esgotos e às modernas etares.

O mais ilustre médico romano foi Celso, embora alguns historiadores questionem tal afirmação por não haver a certeza de ele ter sido médico, podendo ter sido apenas filiatra, o que significa amigo dos médicos. Na verdade, Celso, era um verdadeiro enciclopedista e a sua obra completa «De Artibus», trata de agricultura, medicina, arte militar, retórica, filosofia e jurisprudência. Esta obra foi escrita entre os anos 25 e 35 D.C., e pensa-se que foi pouco divulgada e por isso se perdeu. Curiosamente, foi já na transição do século XIV para o XV, que o Papa Nicolau V encontrou o volume dedicado à medicina e o editou sob o nome de «De Re Medica», que foi o primeiro livro de medicina impresso, sendo a 1ª edição impressa em Florença.
Celso dividiu o livro em 3 partes: a dietética, a farmácia e a cirurgia, porque entendeu que as doenças se devem classificar não segundo a sua origem, mas sim de acordo com a forma como se tratam. Daí que umas se tratem com dieta, outras com medicamentos e outras com a cirurgia.
Mas o mais importante que Celso nos deixou e que ainda hoje se continua a ensinar aos estudantes de medicina foi a descrição dos sinais da inflamação e da infecção. Os chamados 4 sinais de Celso – o tumor, o calor, o rubor e a dor.

Aparece depois Galeno que representa uma viragem nas teorias médicas até aí seguidas.
Para Galeno, o corpo não é senão um instrumento da alma. Descreveu a circulação do sangue, que admite a comunicação dos dois ventrículos através de poros invisíveis. Fez experiências em animais sobre lesões cerebrais e distinguiu as lesões dos dois hemisférios, do cérebro e do cerebelo e conseguiu distinguir os nervos motores dos sensitivos. Foi o primeiro a demonstrar que as artérias pulsavam e a mostrar as lesões causadas pela secção dos nervos.
Enunciou o princípio de que toda a alteração da função, deriva de uma alteração do órgão e de que toda a lesão do órgão tem por consequência a alteração da função. A sangria ocupa lugar de destaque na medicina galénica.
A medicina militar teve grande desenvolvimento na Roma imperial. Cada legião ou navio de guerra tinha um médico, chamado imune, o que significava que estava isento do serviço militar. Como? Os médicos dependiam directamente do comandante do Corpo ou na sua ausência do Tribuno das Legiões. Os médicos navais eram chamados «duplicari», porque recebiam a dobrar. Os médicos da Corte chamavam-se arquiatras palatinos.
A organização hospitalar romana era impecável, segundo padrões que ainda hoje causam inveja, como bem o mostram os vestígios de hospitais, ou valetudinários, encontrados em Viena, Bona e Baden.
Apareceram as primeiras mulheres médicas, para além das comadres que ajudavam nos partos.
Encontra-se pela primeira vez, na medicina de Roma, o início da medicina legal e a constituição de uma organização sanitária, com leis perfeitas e adequadas.

(continua)

CVR

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