segunda-feira, março 20, 2006

A Sé de Lisboa



A Sé de Lisboa, também conhecida como Sé Catedral ou Igreja de Santa Maria Maior de Lisboa, parece remontar ao ano de 1147, data em que Afonso Henriques ou Afonso I de Portugal, conquista Lisboa, até aí sob o domínio muçulmano. Terá sido pouco depois dessa data que se terá iniciado a construção desta Igreja.Nessa altura a cidade de Lisboa reduzia-se a uma fortificação dotada de uma muralha de três lanços, dois deles tendo como ponto de partida o castelo que dominava a colina e o outro correndo ao longo do rio Tejo. E já nessa altura o desenvolvimento da cidade se centrava mais em volta do rio do que em volta do castelo. Nesse tempo e nos anos imediatamente seguintes, pode dizer-se que Lisboa apresentava três centros de desenvolvimento – o Castelo, Alfama e a Mouraria.A Igreja edificada nessa altura não corresponde à actual porque foi sofrendo, ao longo dos anos, vários acidentes e sofrendo graves estragos motivados por sismos de intensidade variada consoante a época em que aconteceram. De realçar os sismos acontecidos nos séculos XIV, XVI e XVIII, muito especialmente o que destruiu grande parte da cidade de Lisboa, em 1755. Esta destruição quase total da cidade deu origem àquilo que hoje chamamos a Baixa pombalina, com as suas características modernas e progressistas, em que a cidade foi reconstruída segundo um esquema baseado no traçado de ruas perpendiculares e espaçosas.O Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho e Mello, poderoso Ministro do Reino encarregou dessa reconstrução da cidade, Manuel da Maia que se fez rodear de colaboradores como Eugénio dos Santos e Carlos Mardel.Parece que a Sé de Lisboa terá sido construída no local onde existia anteriormente uma Mesquita de culto islâmico, que se supõe ter sido construída sobre um templo romano dedicado ao Imperador Augusto ou a Roma. A Sé de Lisboa é um belo exemplo de arquitectura religiosa medieval, em que os conceitos estéticos foram sacrificados às necessidades defensivas, daí o seu aspecto robusto e amuralhado, muito próximo do estilo românico tardio.Durante os séculos que se seguiram à sua construção, a Sé de Lisboa sofreu variadíssimas alterações em relação ao seu projecto inicial. No século XII foi erigido um corpo central com um pórtico de acesso constituído por quatro arquivoltas semicirculares incidentes em oito capitéis de decoração vegetalista e figurativa, com figuras estilizadas que tradicionalmente se tem pensado que serão representações dos mártires cristãos de Lisboa, do século IV, Júlia, Máximo e Veríssimo e um vão superior dominado por uma rosácea central, que cria uma estrutura de dois andares. Os vitrais da rosácea foram executados já neste século, nos anos 30, na fábrica de Ricardo Leone e foram feitos através da reconstituição de vários fragmentos encontrados do antigo vitral. Esta fachada é orientada a poente e é ladeada por duas enormes torres de secção quadrada com contrafortes e frestas, rematados por uma crista de merlões que acentuam o aspecto de fortaleza que a robustez dos muros definiam e materializavam. Estas torres são actualmente torres sineiras, substituindo nessa função a primitiva torre, destruída pelo terramoto de 1755 e que parece ter tido três andares e estar erguida sobre o cruzeiro. Hoje em dia, os sinos são visíveis através de vãos reentrantes adornados de colunelos. Na parede da torre sul pode ver-se um relógio de sol que deve ser anterior ao século XIX, uma vez que já aparece em gravuras desse século.Parece que esta fase inicial da Sé de Lisboa terá sido influenciada pela construção e arquitectura da Sé Velha de Coimbra, complementada nalguns aspectos pelos exemplares da arquitectura medieval que eram as catedrais de Évora, da Guarda e do Mosteiro da Batalha. Isso faz com que a Sé Catedral de Lisboa não se possa considerar um exemplar único da arquitectura nacional dessa época, apesar da sua acabada originalidade e personalidade.O corpo da Igreja é constituído por três naves de seis tramos, com a nave central mais elevada em relação às outras duas que para além de mais baixas são também mais estreitas. Diferem também porque a nave central termina em abóbada de berço perfeita articulada por aros torais enquanto as laterais acabam em abóbadas de arestas. Sobre os arcos torais da nave central corre o trifório, que aparece como um elemento arquitectónico inovador da Sé de Lisboa e posteriormente usado noutras construções e que no seu conjunto definem a nave central em dois andares, técnica original e que nada tem a ver com o modelo da Sé Velha de Coimbra. Os pilares, muito espessos, têm estrutura cruciforme e várias colunas adossadas, assentando os arcos torais nas colunas mais robustas.No cruzeiro eleva-se uma cúpula octogonal com abóbada de cantaria de oito nervuras e florão central. No transepto abrem-se dois grandes arcos de acesso ao deambulatório onde chama a atenção o facto de se ver a transformação da primitiva volta perfeita em ogiva. O transepto é coberto com abóbada de berço e é assimétrico no remate das paredes norte e sul, com o trifório a apresentar-se como tribuna.Tudo indica que inicialmente a igreja fosse rematada por uma charola simples, constituída pela capela-mor e por duas pequenas capelas absidiais, tal como se vê na Sé de Coimbra. Mas no século XII foi acrescentado um corpo lateral, desde o braço do transepto ao portal lateral da fachada norte e que é conhecido como o Camarim do Patriarca. E desde essa altura as obras na Sé de Lisboa, por causa dos terramotos ou por quaisquer outros motivos, passaram a ser uma constante.O baptistério do século XVII situa-se na torre setentrional, com abóbada de arestas e que no século XVIII foi revestida a azulejos de figura, com representações do Baptismo de Cristo e da Pregação de Santo António de Lisboa aos peixes, entre outros temas menos importantes.No fim do século XIII e princípio do XIV foi construída a chamada Capela de Bartolomeu Joanes, importante mercador lisboeta, que pagou a sua construção. É uma capela de estilo gótico com dois ramos e abside poligonal e com uma abóbada de ogivas que partem de colunas finas. É nesta Capela que sobre o altar gótico existe um retábulo de altar de oito tábuas maneiristas, da Escola de Grão Vasco e datadas da segunda metade do século XVI, que representam o Mosteiro de S. Bartolomeu, a Adoração dos Magos, a Anunciação, a Descida da Cruz e a Natividade e a Ceia de Cristo. Mas mais importante que este retábulo é o Presépio feito por Machado de Castro, datado de 1766, e que constitui um elemento representativo do gosto do pintor e corrente no século XVIII. É uma obra lindíssima constituída por inúmeras figuras em barro cozido, policromadas, e de pequenas dimensões, distribuídas cenograficamente. Na ilharga norte e indo de poente para nascente, pode ver-se a torre setentrional, a parte externa da capela gótica, coroada de merlões e rasgada de frestas de arco quebrado com porta lateral de acesso. Depois oferece-se a Sacristia dominada pela sala do Tesouro Velho, pelo topo do transepto, um pano de muro com janelão de três lumes e a muralha envolvente do claustro gótico.A fachada nascente apresenta seis janelões rasgados numa muralha compacta e elevada. Na fachada sul há um muro de suporte rematado por merlões e uma janela de arco quebrado. E por fim a torre sul.O transepto desenvolve-se em cinco tramos e é coberto de uma abóbada de berço perfeito e apresenta composição assimétrica nas faces internas dos topos norte e sul. O trifório prolonga-se nos dois braços como se fosse uma tribuna.Durante o tempo de Afonso IV, entre os anos de 1325 e 1357 houve importantes alterações na Sé, especialmente a nível do transepto, da torre-lanterna e da capela-mor, que nada tinha a ver com o seu aspecto actual. Hoje, a capela-mor apresenta-se em estilo barroco e neoclássico, revestida a estuque, pinturas e mármores, uma abóbada em arco abatido, pilastras jónicas e nove janelões atípicos que permitem uma luminosidade melhor da que haveria no tempo de Afonso IV. Destinava-se a esta Capela o famoso políptico de São Vicente que se encontra no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, e que se atribui a Nuno Gonçalves. Este políptico tem sido objecto de numerosos estudos e teses de doutoramento, incidindo sobre a sua verdadeira autoria e sobre as figuras ali representadas, muito especialmente sobre uma delas que muitos defendem representar o Infante D. Henrique, o navegador.As capelas radiantes foram reconstruídas depois do terramoto de 1755 e apresentam interiormente um tramo rectangular e uma abside poligonal de três panos rasgados por estreitas frestas maineladas que apresentam vitrais modernos e têm abóbadas de ogiva. No acesso a estas capelas, as colunas têm capitéis ornamentados com motivos vegetalistas marítimos e terrestres pretendendo representar os vários sectores da actividade económica portuguesa. É importante que se diga que a estrutura arquitectónica destas capelas serviu de modelo aos quatro absidíolos da igreja do Mosteiro da Batalha, com o traço de Mestre Afonso Domingues.O Claustro foi erguido no tempo de D. Dinis. No tempo de Afonso IV foi muito alterada a sua estrutura e o seu desenho, tendo-lhe sido acrescentado um segundo andar. A cobertura das galerias é de ogivas simples e sem formalotes que arrancam, como os arcos torais, de mísulas cónicas inseridas nos muros, em tudo semelhantes aos que se encontram no Mosteiro de Alcobaça e que lhe terão servido de modelo.Em apoio da teoria que diz que a Sé terá sido construída no local onde teria existido uma Mesquita, existem algumas pedras visigóticas, a mais importante delas apresentando a representação de animais quadrúpedes e aves, com arcos e conchas, metidas nas paredes da actual Sé de Lisboa. E em apoio de ter havido no mesmo local um templo pagão romano, também se podem ver nas paredes da Sé algumas pedras de origem romana.Em 1911 iniciou-se o restauro integral da Sé, que veio a prolongar-se até aos anos trinta. Em 1991 abriu-se um poço no jardim do claustro e, por acidente ocorrido, verificou-se que o poço dava acesso a vestígios de várias construções antigas e onde se encontraram parte de um muro romano, vestígios de construções árabes, e um pano verde fenício. Até esta data continuam as investigações arqueológicas e as escavações, sendo de prever a abertura de um museu.

CVR

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