sábado, novembro 05, 2005

contos da biblioteca

Nunca vi a sala assim tão vazia. Ainda por cima, o dia está triste, carregado, sombrio. E, abafado também. Mas, aqui, protegidos pelos vidros das portas e janelas, que deixam entrar o verde, mais do que a luz, mas não o opaco pesado do dia, aquele opaco húmido de certos dias de África, nada disso se sente e apenas se pressente.
Interrogo-me se aqui dentro, normalmente, se sente ou se pressente, ou se se sucedem sensações e sentimentos. Se nesta ordem, se na inversa. Uma vez assim, e outra vez, outra.
Repito. Aqui sente-se ou pressente-se? Penso que já não consigo sair daqui. Penso que se sucedem as duas coisas. Sentir, sente-se com certeza e não podia deixar de ser, não poderia ser de outra maneira, a menos que, livros, cultura e seu meio de cultura fossem sentimento-resistentes. E, não são. Pressentir, pressente-se. Em cada frase, pelo menos algumas vezes, se pressente o sentimento que depois virá. Cada parágrafo, cada período ou frase, são rectas e curvas onde se corre do pressentir ao sentir.
O bar continua em obras e fechado. E eu aqui continuo, forçado a escrever no tempo em que normalmente estaria a tomar a bica e a comer o queque da norma. E aqui, e assim, continuarei até que os livros que requisitei pousem na minha mesa de leitura, atirados, mais que postos, pelas mãos cansadas de uma das muitas empregadas, fartas desta tarefa e que empurram os carrinhos dos livros como quem empurra o carrinho das compras, carregados de suor de trabalho condensado em latas, pós para a máquina de lavar, se a houver, sacos de arroz e de feijão.
Acabo neste momento de me enganar, porque a empregada que agora me trouxe o primeiro livro, e mais uma informação, o fez com gosto, simpatia e ausência de esforço ou sacrifício. Enganar-me, é rotina, o que não pode impedir que eu raciocine e conclua, com os dados que vou tendo. E, quando me engano, só há que corrigir e modificar.

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