Das raízes nascemos, mas não nos apercebemos. Das origens nos formamos, mas não o sabemos. Das raízes crescemos, sem o saber, sem o querer saber. Das raízes nos vamos fazendo, tronco e ramos, folhas e seiva. Talvez o saibamos, mas mais vezes as rejeitamos do que as aceitamos.
As raízes negamos, já árvores feitas, copas formadas, ramos completos, floridos, dando enxertos. E se não o fazemos, se não as negamos, pelo menos, esquecemo-las.
Das raízes nascemos, crescemos, fomos e somos, sem aparentemente o sabermos.
Muitos de nós, chegam a rejeitá-las e a querer cortá-las. E se não as cortam, não cuidam de as adubar, e, muito menos, de delas cuidar.
Porém, as raízes tudo aguentam, estoicamente, em silêncio, sofridamente, mas sempre presentes, mesmo quando simbolicamente cortadas. Presentes, sim. Disse bem. Contudo, não suficientemente aparentes para quem pensa que as cortou. Apenas aparentes, muitas vezes, a todos aqueles que, em cada instante ou apenas de quando em quando, se dão conta de que elas estão lá, bem agarradas, dando sinais de si, tomando conta de quem as quis cortar, de quem as quis negar.
Sem raízes aparentes se vive longamente, ou pensando apenas que sem elas se vive, e, inconscientemente, tudo fazendo para desconhecer que elas o integram e estão dentro dele, bem reais.
Mas um dia, um fulminante dia, um clarão se faz no interior destes pseudo desenraizados e lhes anuncia não sabem eles ainda bem o quê. Do clarão, apenas a luz, apenas o anúncio. A revelação, essa, irá demorar um pouco mais.
E é então, que os desenraizados cada dia começam a dar-se conta de pequenos aparentes nadas que aparecem nas suas vidas, no seu pensamento, nas suas falas, sem saberem porquê, sem saberem como, sem saberem para quê. No princípio, apenas sinais, depois dúvidas, logo depois incómodo, aquele que sempre vem do que não se conhece ou não se domina.
E, mais tempo passado, uma luz, uma pequena luz, já não um clarão, lhes volta a perturbar a aparente estabilidade do seu ser, da sua maneira de ser. E, subitamente, um dia, encontram-se a pensar em como tinha sido curiosa a maneira como se expressaram quando quiseram dar conta de algo que já nem sabem o que era e para o caso não interessa. Só recordam que tinha sido curioso, assim o pensam, ter-lhes vindo à lembrança aquela vez em que ... E este «que» varia muito de uns para outros, consoante o momento em que surgiu e as relações que posteriormente poderão talvez vir a fazer. «E aquela vez em que», que agora os pôs a pensar, terá a ver com a sua terra, a sua juventude, a sua casa, a escola primária, a vinha de seu pai, a matança do porco, o passeio de domingo, a festa dos bombeiros .... Que estranho, tão estranho ....
E assim continuará, a ser estranho, tão estranho, por bastante mais tempo, já com sinais repetidos de que algo de novo se está a passar. Até que um dia, o desenraizado se ouve a dizer -- há quanto tempo não vou à minha terra? E, dessa vez, ainda não dirá que tem saudades de lá voltar. Dirá, talvez e apenas, que tem de lá ir «um dia destes». Só passado algum tempo se dará a partilha com o outro, aquele que com ele faz o par. E, um dia, ouve-se a dizer -- amor, queres ir passar um fim de semana à minha terra, para variar?
Vezes há, em que o processo é simplificado e se faz talvez com menos dor, por via de uma carta recebida, com espanto e desusada alegria, mandada por uma apelidada comissão dos antigos alunos, que anuncia a realização de uma reunião com um programa aliciante, que será abrilhantada por vários actos e que permitirá o reencontro daqueles que há décadas se não encontram e quase se ignoram. E no fim da carta, a rematar, e como definitiva mensagem, o desejo manifesto daquela comissão que lhe diz, para que o não esqueça -- esperamos que não faltes e traz toda a tua trupe.
De uma forma ou de outra, ou de outra ainda, um dia, santo dia, encontrar-se-á o desenraizado a caminho do «buraco» onde nasceu, como costumava dizer quando a tal terra se referia ou «às berças», como outras vezes dizia e costumavam dizer os mais delicados e menos desligados.
E só depois de se dar este encontro, não sei de que grau, da árvore com as suas raízes, se inicia um novo processo de revivificação, de rejuvenescimento, de renascimento, de caminho final para o encontro do seu verdadeiro berço, do seu verdadeiro sentido de estar na vida. E, então, é ver o citadino a descobrir as maravilhas da natureza esquecida, da sua e da envolvente, a pureza do ar e a sua própria, a grandeza dos corações dos, até então, ausentes amigos, a frescura da seiva a correr, a leveza novamente encontrada, a memória e as memórias reencontradas de cheiros, sons, afectos e a verificação do erro, por vezes crasso e irrecuperável, de um dia ter pensado que a sua verdadeira vida apenas começara quando abandonara aquele «buraco».
É então que se dá conta que os seus verdadeiros amigos são aqueles que agora o abraçam e saúdam, como o faziam na juventude e que com ele fizeram a amizade que resiste a tudo, ao tempo, à distância e até ao esquecimento, sem ter precisado de laços ou juras de sangue, devendo, contudo, ter-se o cuidado, mas não a garantia, de manter uma certa reserva com um ou outro que por defeito de fabrico tenha saído de 2ª ou 3ª escolha, na fase de cozedura moral e ética.
É então que lhe vem ao pensamento que toda a sua vida foi uma vida de enganos, de representações, de fugas à realidade, de procura constante do que não podia encontrar enquanto não reconhecesse as suas raízes, não percebesse de uma vez por todas que cada raiz dá a sua própria árvore, com características próprias e absolutamente individuais. Só então perceberá que aquilo que leu nos livros, as teorias que conheceu ao longo dos tempos, psicanalíticas ou não, lhe apontavam o caminho e a forma de o encontrar, e que estes se mostravam de uma forma tão evidente, que só mesmo a sua escura cegueira demorara a querer ver. Só então percebeu que são necessárias raízes sãs, para haver árvores perfeitas e saudáveis e que mesmo quando a árvore adoece, se a raiz não morrer, voltarão a nascer ramos, folhas, flores, frutos, se a árvore for dessas, e a seiva voltará a circular.
Só então perceberá que raízes e destino são inseparáveis, por mais que alguns se possam rir de frase tão aparentemente redutora. Mas, quando o desenraizado se dá conta desta forte verdade, perceberá que aparente tinha sido tudo até então, e que para que um ciclo de vida se cumpra e cada um saiba que se cumpriu, se torna necessário nunca ignorar as suas raízes, agradecer a quem lhas deu, agradecer á terra que lhas alimentou e lhe permitiu, com a sua formação de base e base de tudo, construir a sua vida da forma que lhe pareceu a melhor e reconhecer ainda a tempo que, se pode dizer que se cumpriu, sabe, finalmente e de uma forma de total evidência, que deve às suas boas raízes o ter aguentado todos os trambolhões da vida, todas as sacanices e invejas que sofreu e o poder ter seguido sempre de cara levantada, sabendo e respeitando sempre o valor da palavra e a força do carácter que se molda enquanto as raízes crescem.
Por mim, que agora vos falo destas coisas, devo dizer-vos que já há muito tempo percebi esta forte ligação e me mordo todo por não conseguir vir mais vezes a esta querida terra mãe.
As raízes negamos, já árvores feitas, copas formadas, ramos completos, floridos, dando enxertos. E se não o fazemos, se não as negamos, pelo menos, esquecemo-las.
Das raízes nascemos, crescemos, fomos e somos, sem aparentemente o sabermos.
Muitos de nós, chegam a rejeitá-las e a querer cortá-las. E se não as cortam, não cuidam de as adubar, e, muito menos, de delas cuidar.
Porém, as raízes tudo aguentam, estoicamente, em silêncio, sofridamente, mas sempre presentes, mesmo quando simbolicamente cortadas. Presentes, sim. Disse bem. Contudo, não suficientemente aparentes para quem pensa que as cortou. Apenas aparentes, muitas vezes, a todos aqueles que, em cada instante ou apenas de quando em quando, se dão conta de que elas estão lá, bem agarradas, dando sinais de si, tomando conta de quem as quis cortar, de quem as quis negar.
Sem raízes aparentes se vive longamente, ou pensando apenas que sem elas se vive, e, inconscientemente, tudo fazendo para desconhecer que elas o integram e estão dentro dele, bem reais.
Mas um dia, um fulminante dia, um clarão se faz no interior destes pseudo desenraizados e lhes anuncia não sabem eles ainda bem o quê. Do clarão, apenas a luz, apenas o anúncio. A revelação, essa, irá demorar um pouco mais.
E é então, que os desenraizados cada dia começam a dar-se conta de pequenos aparentes nadas que aparecem nas suas vidas, no seu pensamento, nas suas falas, sem saberem porquê, sem saberem como, sem saberem para quê. No princípio, apenas sinais, depois dúvidas, logo depois incómodo, aquele que sempre vem do que não se conhece ou não se domina.
E, mais tempo passado, uma luz, uma pequena luz, já não um clarão, lhes volta a perturbar a aparente estabilidade do seu ser, da sua maneira de ser. E, subitamente, um dia, encontram-se a pensar em como tinha sido curiosa a maneira como se expressaram quando quiseram dar conta de algo que já nem sabem o que era e para o caso não interessa. Só recordam que tinha sido curioso, assim o pensam, ter-lhes vindo à lembrança aquela vez em que ... E este «que» varia muito de uns para outros, consoante o momento em que surgiu e as relações que posteriormente poderão talvez vir a fazer. «E aquela vez em que», que agora os pôs a pensar, terá a ver com a sua terra, a sua juventude, a sua casa, a escola primária, a vinha de seu pai, a matança do porco, o passeio de domingo, a festa dos bombeiros .... Que estranho, tão estranho ....
E assim continuará, a ser estranho, tão estranho, por bastante mais tempo, já com sinais repetidos de que algo de novo se está a passar. Até que um dia, o desenraizado se ouve a dizer -- há quanto tempo não vou à minha terra? E, dessa vez, ainda não dirá que tem saudades de lá voltar. Dirá, talvez e apenas, que tem de lá ir «um dia destes». Só passado algum tempo se dará a partilha com o outro, aquele que com ele faz o par. E, um dia, ouve-se a dizer -- amor, queres ir passar um fim de semana à minha terra, para variar?
Vezes há, em que o processo é simplificado e se faz talvez com menos dor, por via de uma carta recebida, com espanto e desusada alegria, mandada por uma apelidada comissão dos antigos alunos, que anuncia a realização de uma reunião com um programa aliciante, que será abrilhantada por vários actos e que permitirá o reencontro daqueles que há décadas se não encontram e quase se ignoram. E no fim da carta, a rematar, e como definitiva mensagem, o desejo manifesto daquela comissão que lhe diz, para que o não esqueça -- esperamos que não faltes e traz toda a tua trupe.
De uma forma ou de outra, ou de outra ainda, um dia, santo dia, encontrar-se-á o desenraizado a caminho do «buraco» onde nasceu, como costumava dizer quando a tal terra se referia ou «às berças», como outras vezes dizia e costumavam dizer os mais delicados e menos desligados.
E só depois de se dar este encontro, não sei de que grau, da árvore com as suas raízes, se inicia um novo processo de revivificação, de rejuvenescimento, de renascimento, de caminho final para o encontro do seu verdadeiro berço, do seu verdadeiro sentido de estar na vida. E, então, é ver o citadino a descobrir as maravilhas da natureza esquecida, da sua e da envolvente, a pureza do ar e a sua própria, a grandeza dos corações dos, até então, ausentes amigos, a frescura da seiva a correr, a leveza novamente encontrada, a memória e as memórias reencontradas de cheiros, sons, afectos e a verificação do erro, por vezes crasso e irrecuperável, de um dia ter pensado que a sua verdadeira vida apenas começara quando abandonara aquele «buraco».
É então que se dá conta que os seus verdadeiros amigos são aqueles que agora o abraçam e saúdam, como o faziam na juventude e que com ele fizeram a amizade que resiste a tudo, ao tempo, à distância e até ao esquecimento, sem ter precisado de laços ou juras de sangue, devendo, contudo, ter-se o cuidado, mas não a garantia, de manter uma certa reserva com um ou outro que por defeito de fabrico tenha saído de 2ª ou 3ª escolha, na fase de cozedura moral e ética.
É então que lhe vem ao pensamento que toda a sua vida foi uma vida de enganos, de representações, de fugas à realidade, de procura constante do que não podia encontrar enquanto não reconhecesse as suas raízes, não percebesse de uma vez por todas que cada raiz dá a sua própria árvore, com características próprias e absolutamente individuais. Só então perceberá que aquilo que leu nos livros, as teorias que conheceu ao longo dos tempos, psicanalíticas ou não, lhe apontavam o caminho e a forma de o encontrar, e que estes se mostravam de uma forma tão evidente, que só mesmo a sua escura cegueira demorara a querer ver. Só então percebeu que são necessárias raízes sãs, para haver árvores perfeitas e saudáveis e que mesmo quando a árvore adoece, se a raiz não morrer, voltarão a nascer ramos, folhas, flores, frutos, se a árvore for dessas, e a seiva voltará a circular.
Só então perceberá que raízes e destino são inseparáveis, por mais que alguns se possam rir de frase tão aparentemente redutora. Mas, quando o desenraizado se dá conta desta forte verdade, perceberá que aparente tinha sido tudo até então, e que para que um ciclo de vida se cumpra e cada um saiba que se cumpriu, se torna necessário nunca ignorar as suas raízes, agradecer a quem lhas deu, agradecer á terra que lhas alimentou e lhe permitiu, com a sua formação de base e base de tudo, construir a sua vida da forma que lhe pareceu a melhor e reconhecer ainda a tempo que, se pode dizer que se cumpriu, sabe, finalmente e de uma forma de total evidência, que deve às suas boas raízes o ter aguentado todos os trambolhões da vida, todas as sacanices e invejas que sofreu e o poder ter seguido sempre de cara levantada, sabendo e respeitando sempre o valor da palavra e a força do carácter que se molda enquanto as raízes crescem.
Por mim, que agora vos falo destas coisas, devo dizer-vos que já há muito tempo percebi esta forte ligação e me mordo todo por não conseguir vir mais vezes a esta querida terra mãe.
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